O cidadão Januário Torgal Ferreira disse que "há jogos atrás da cortina e corrupção, este governo é profundamente corrupto nestas atitudes a que estamos a assistir".
O porta-voz da Conferência Episcopal já veio recordar o óbvio: que o
bispo falou em nome individual. Sobre matérias políticas, é assim,
apesar de nem sempre assim acontecer, que se espera que os bispos falem:
em seu nome. Sendo certo que por serem bispos não deixam de ser
cidadãos e não perdem o direito à palavra.
Aguiar Branco, falando como ministro da
Defesa - ou seja, em nome do Estado -, respondeu ao bispo. Não se
limitou, como fez o ministro da Saúde, Paulo Macedo, a reagir ao seu
conteúdo. Isso é o que se espera e nenhum bispo está acima do
contraditório. Aguiar Branco preferiu discutir a legitimidade de
Januário Torgal Ferreira falar sobre política. Disse o ex-candidato
derrotado à liderança do PSD que "o senhor bispo deve obediência às
regras da Igreja", que "causa embaraço à Igreja" e que espera "que faça
uma opção: ou ser comentador político ou ser bispo das Forças Armadas".
Sem perder tempo com esta ideia de que opinar sobre a vida do País é exclusivo de comentadores, gostava de saber quando
é que o senhor Aguiar Branco foi mandatado pela Igreja Católica
Apostólica Romana para decidir o que deve ela tolerar ou não aos seus
bispos? Para pedir a sua demissão? Para recordar as suas obediências
à hierarquia religiosa? Esse mandato é extensível às restantes
confissões religiosas? Dura enquanto ele for ministro ou é vitalício?
Por fim, gostaria que o advogado nos informasse qual
é o artigo da Constituição que impede os bispos de darem as suas
opiniões sobre a vida política? O que disse Aguiar Branco quando os
bispos tomaram posição (com todo o direito) numa campanha para um
referendo a uma lei (a da despenalização da IVG) em que p ministro
participou ativamente? Mandou-os escolher entre o sacerdócio e a
intervenção cívica? Não é a alteração de uma lei um tema tão político,
ou tão ético, ou tão cívico, como a corrupção? A regra é os bispos
dizerem amen às opiniões do senhor Aguiar Branco e só abrirem a boca com
a sua devida bênção?
Devo dizer que prefiro, sobre corrupção,
incompatibilizes, promiscuidades e tráfico de influências, intervenções
mais estruturadas, fundamentadas e com os nomes dados aos bois. como
esta (ver vídeo: http://videos.sapo.pt/kzZH4Ua8qCjuDPNQkL9a), de Paulo Morais.
Quando escrevo sobre estes temas é assim que o tento fazer: dizer os
nomes das pessoas. Claro que quando isto se faz somos acusados de
enlamear as pessoas e baixar o nível da política. Mas sou dos que acho
que não o fazer é enlamear incertos, fazendo pagar o justo pelo pecador.
Acontece que, ao contrário de Paulo Morais, Torgal
Ferreira é um homem sem experiência política. Mas vive neste País e,
como a generalidade das pessoas honestas, indigna-se com o clima de
saque em que vivemos. E dá voz a isso, dizendo o que a generalidade das
pessoas sentem. Pode ser discutível a forma como o faz. Mas não é
discutível o seu direito a fazê-lo. O senhor Aguiar Branco gostava que o
País ficasse calado, deixando a liberdade de expressão como exclusivo
dos comentadores políticos? Aguente-se! Até ver, ainda vivemos em
democracia. E também vivemos num Estado laico, onde a Igreja não decide
quem é ministro e o governo não decide que é bispo.