"Passos, O Cumpridor"

Artigo de opinião de Pedro Nuno Santos no jornal "i".

O primeiro-ministro, no último debate quinzenal, voltou a atacar os partidos que defendem a renegociação da dívida, acusando-os de não a quererem pagar. Ao contrário dele próprio e do governo que dirige. 

É revoltante ter de o ouvir a apresentar-se como cumpridor quando, até agora, ele foi o único político que decidiu efectivamente não pagar. 

Sim, Passos Coelho e o seu governo foram os únicos que, em nome do Estado português, não pagaram a milhões de portugueses salários e pensões. Não deixa de ser caricato que aqueles que defendem o Memorando, assustando os portugueses com o risco da falta de dinheiro para pagar salários e pensões, sejam exactamente os mesmos que já não pagaram dois salários e duas pensões aos trabalhadores do sector público e aos reformados. 

O debate sobre a renegociação da dívida não deveria ser moral porque não se trata de um debate sobre a honestidade do Estado português. O debate sobre a renegociação da dívida não deveria ser um debate sobre a vontade, ou não, de pagar, mas antes sobre a capacidade real de o conseguir fazer no quadro de uma economia profundamente deprimida como a nossa. 

O debate sobre a renegociação da dívida deveria ser também um debate sobre escolhas. É disso que se trata quando estamos em depressão e não conseguimos pagar tudo e a todos ao ritmo e ao preço a que deveríamos. Foi isso que fizeram Passos Coelho e o seu governo. 

Decidiram não pagar aos trabalhadores do sector público e aos reformados para não falharem com os credores internacionais. O que distingue Passos Coelho dos que defendem a renegociação com os credores internacionais não é mais ou menos honestidade. 

É, sim, o facto de a escolha do primeiro-ministro ter sido não pagar aos mais frágeis e sem negociação.

Pedro Nuno Santos