"As opções da Europa, o Orçamento de Portugal e as alternativas"
"As medidas inscritas na proposta de lei do Orçamento do Estado
para 2012 - corte de dois meses de salário e pensões no sector público,
cortes na despesa com a Segurança Social, a Saúde e a Educação, e
aumento da carga fiscal indirecta - convergem no sentido de uma profunda
depressão económica em Portugal.
A estratégia subjacente ao
Orçamento de 2012 será incapaz de cumprir os objectivos de redução do
défice e da dívida pública. A capacidade de obtenção de receita fiscal
irá ressentir-se não só da contracção do rendimento, como da expansão da
economia paralela e do aumento da evasão fiscal. Iremos assistir a
sucessivas "surpresas" e adendas restritivas. Ao longo deste processo, o
endividamento não deixará de aumentar em valor absoluto e em
percentagem do PIB.
A "desvalorização interna" implícita no
Orçamento não permitirá reequilibrar o défice externo. A recessão
anunciada para 2012 é instrumental para a estratégia de "desvalorização
interna", que visa aumentar o desemprego para reduzir o nível dos
salários, de forma a tornar mais competitivas as exportações
portuguesas. No entanto, esta desvalorização interna é enganosa por dois
motivos: (a) o nível de redução dos salários necessário para produzir
um resultado comparável ao de uma desvalorização cambial é socialmente
insustentável; (b) o efeito da desvalorização interna em Portugal será
anulado, como acontece com o das desvalorizações competitivas, pelo
facto de os maiores parceiros comerciais de Portugal estarem a
prosseguir estratégias idênticas.
A confiança dos credores não
será restabelecida. No final de 2013 a economia portuguesa terá
regredido para o nível do produto de há uma década. No entanto, a
situação será incomparavelmente pior do que a de então: tanto o
desemprego como a dívida pública terão duplicado. Compreende-se mal por
que razão, neste quadro, os credores recuperariam a confiança perdida. A
economia portuguesa estará destroçada e será tratada como uma economia
insolvente por todos os credores, incluindo o FMI, o BCE e a União
Europeia."
Artigo de Américo Mendes, Ana Costa, João Ferrão, José Castro Caldas, Manuel Brandão Alves e Manuela Silva, publicado no Público