As Grândolas que Marcelo quer abafar

A semana passada foi pródiga em acontecimentos envolvendo derro­tas sucessivas para o Governo. Não é com regozijo que afirmo que Por­tugal e os portugueses souberam, preto no branco que a estratégia de “ir além da Troika”, a política do “custe o que custar” e o “não preci­samos de mais tempo nem de mais dinheiro”, ruiu como um castelo de cartas, para mal do nosso futuro.

E o que se faz quando algo corre mal? Muda-se? Não! Passos Coelho, Relvas e Gaspar querem continuar no mesmo caminho. No caminho mais do que óbvio que provoca o aumento da dívida, do défice e do desemprego.

A isto, o povo responde com indig­nação. Ressurgiu “Grândola, Vila Morena”, ícone dos anos 70 da luta pela liberdade e agora assume-se como imagem da luta Portuguesa pela justiça social, protesto e liber­dade económica.

Grândolas entoadas em coro pe­rante ministros e secretários de estado como forma desesperada de demonstração do descontenta­mento de um povo que já vendeu todos os seus “anéis” e que ficará sem “dedos” se esta política conti­nuar. O problema é que ainda nin­guém percebeu que os “dedos” são fundamentais para trabalhar, pro­duzir, crescer e pagar os compro­missos assumidos e dessa forma, a real resposta está a nível europeu, numa elite controlada por senhores feudais que olham para Portugal de soslaio e tem nos nossos governan­tes, cúmplices de caminhada.

Logicamente que a liberdade deve ser equitativa. As manifestações devem surgir, mas também devem respeitar outrem. Dessa forma, in­terromper ministros não será a melhor forma de demonstrar o de­sagrado numa democracia, ao con­trário daquilo que pensavam até 2011 certas pessoas/organizações que neste momento sofrem na pele ainda piores mas compreensíveis manifestações de desagrado. Antes aplaudiam e incitavam. Agora fo­gem e condenam.

Por seu turno, surge a figura de Marcelo Rebelo de Sousa. No seu habitual espaço de promoção polí­tica, tenta desvalorizar a manifes­tação de 2 de março e as Grândo­las. O pior é que critica o PSD por falta de “gestão política” e sugestio­na taxativamente o bloqueio à ma­nifestação das Grândolas, incitando a sua juventude partidária a servir de milícia pró-governo, aplaudindo, quiçá apoteoticamente, Passos, Rel­vas, Gaspar e outros. Uma opinião reveladora sobre o que um ex pre­sidente do PSD pensa, sobre a uti­lidade da sua juventude partidária.

Marcelo Rebelo de Sousa surpreen­deu. Fez lembrar os tempos do seu padrinho – Marcelo Caetano, mas a isto, o povo continuará certamente a entoar a Grândola, custe o que custar, doa a quem doer.

O som dos pés a marchar sobre a gravilha, audível no início da mú­sica de Zeca Afonso, será sempre uma realidade, mesmo num país descalço e a sangrar de tanta luta.
 
Nelson Oliveira
in: Jornal de Lousada