Morrer da cura. Talvez esta seja a melhor expressão para caraterizar a atual e futura situação dos municípios e juntas de freguesia no nosso país.
Após o 25 de Abril, o poder local, a par da liberdade de expressão e de uma democracia de pleno direito, foi uma das maiores conquistas da Revolução dos Cravos. Descentralizaram-se competências e aumentou a autonomia das populações fustigadas com a interioridade.
No entanto, parece-nos que este tempo tende a voltar. É certo que muitos erros foram cometidos - exagerou-se. É um facto que muitas autarquias nomeadamente nos “gloriosos anos 90” assumiram compromissos com a banca do crédito fácil, com fundos comunitários desregrados e entraram em situações de decadência financeira, ora por incompetência própria, ora por um Estado demasiado permissivo com este tipo de comportamentos ao invés de os tutelar rigidamente.
Sobreviviam apenas as autarquias que desde sempre souberam gerir os seus parcos recursos com ponderação, mas que ainda hoje são envolvidas no mesmo estigma para com o poder local.
As autarquias foram durante anos conhecidas como uma das principais culpadas pelo descalabro financeiro do país - nada mais falso. Em 2012, no auge da crise financeira a divida das autarquias representava cerca de 8% do PIB enquanto a totalidade da divida pública estava na ordem dos 130%. A par disto, a dívida privada cifrava-se nos 280%!
Aos poucos e também devido às pelas restrições impostas, as autarquias foram o setor do Estado que mais reduziram a dívida. Só este ano reduziram 300 milhões de euros. Estes dados são positivos, mas o cerne da questão está agora no presente e no futuro do poder local.
Neste momento existe uma tendência para continuar a culpabilizar e castigar as autarquias locais. Regras e mais regras são exigidas envolvendo os 308 municípios, continuando a descriminação positiva para quem geriu mal os recursos públicos e castigando aqueles que tiveram consciência das dificuldades.
Os recentes dados divulgados pelo Anuário Financeiro são positivos, no entanto convém ir mais além. Este esforço financeiro tem sido feito por todo o setor do Estado? Não. Basta consultarmos a dívida de algumas empresas públicas e deparamo-nos com dívidas bem superiores à totalidade do poder local.
A correção das contas das autarquias tem sido feito à custa de regras adequadas mas também de regras paralisadoras do poder local. O futuro tende a ser mais sombrio, com os municípios cumpridores a verem-se na necessidade de contribuírem com o seu esforço financeiro para pagar erros de outros, com pouco ou nada em troca.
Com este tipo de políticas injustas como é o Fundo Apoio Municipal, existe uma barreira muito ténue entre um município gerido de forma parcimoniosa, com a realidade imposta pelo corte astronómico que estes irão sofrer.
Talvez passem a ser mais uns a terem problemas provocados pela negligência de um Governo que teima castigar os bons gestores.
As generalizações são sempre demasiado perigosas e com custos imprevisíveis.
Nelson Oliveira
in: Verdadeiro Olhar