CENTRO DE SAÚDE DE LUSTOSA

Eduarda Ferreira - Lustosa

Remonta ainda a 2011 a assinatura de um protocolo que previa a mudança de instalações do Centro de Saúde de Lustosa para a antiga Escola Primária, aliás propriedade do município. 

No decurso de todo o mandato do anterior governo de Passos Coelho, da sua austeridade desmedida e dos seus cortes no sistema nacional de saúde, racionando os gastos, pudemos assistir a uma completa inércia e a um desinteresse quanto a este protocolo. Afinal de contas, Lustosa era apenas Lustosa. Uma ínfima parte do país que mesmo tendo dado a vitória ao PSD nas autárquicas, em troca recebeu NADA.

E pese embora a romaria ao Centro de Saúde de Lustosa, de membros do PSD local e, inclusive, de um deputado lousadense do mesmo partido, em Abril de 2015, onde promessas foram feitas de forma vincada, jurando-se a pés juntos que seria dada solução a este problema através de um pedido expresso a Pedro Passos Coelho – juramentos que ainda hoje circulam em vídeo pelos meandros da internet - seria expectável que a solução fosse encontrada. 

Pois que chegados ao final do mandato do anterior governo, sem que nada fosse feito, a ilação que daqui retiramos é que pouca ou nenhuma influência tiveram os ditos membros na tomada de decisão do poder central. Não sendo isso, talvez se trate do próprio desinteresse dos membros do PSD local. Uma de duas coisas será, atendendo ao marasmo que se continuou a sentir. Promessas que de cumpridas nada tiveram, aliás dando voz ao conceito pejorativo de “promessas políticas”. 

Admirados não ficamos quando se descredibiliza a política por atuações deste cariz. 

Não fossem os esforços da Câmara Municipal de Lousada - os quais pude acompanhar - junto da ARS Norte e do Ministério da Saúde e ainda hoje teríamos o problema em mãos. Durante os ditos anos assisti a um conjunto de diligências que foram feitas para que apenas uma autorização fosse dada, de modo a que a mudança se processasse, pois que a própria Câmara Municipal disponibilizava os serviços técnicos para a elaboração do projeto.

Com todo este desinteresse por parte do Ministério da Saúde do anterior governo e do PSD, a população de Lustosa permanecia com um serviço de saúde débil, com condições medíocres, que não asseguram o mínimo exigível quanto ao sigilo médico, quanto a uma boa organização (assistimos, ainda hoje, a chamadas orais dos médicos para uma sala de espera apinhada com pessoas que não têm a obrigação de ouvir um chamamento que se faz ouvir ao longe – sei disso porque sou utente deste “Centro de Saúde”) - situações de simples resolução que há anos assim persistem, nada se fazendo para se operar uma mudança.

Apesar da mora, a semana passada recebemos uma boa notícia para Lustosa. Numa onda positiva que este governo tem conseguido promover e propalar por todos os cantos do país, tivemos finalmente a notícia de que vamos ter um novo centro de saúde. 

Só nos resta agradecer a persistência e a resiliência por parte da CM Lousada, dos seus responsáveis políticos locais e de alguns deputados do Partido Socialista na vontade de mudar e na vontade de dar a Lustosa boas condições de acesso aos cuidados mínimos de saúde, afinal permitindo que um direito constitucionalmente consagrado seja aplicável a todos os Lustosenses em melhores circunstâncias. 

Causa-me, por isso, certa estranheza, quando outros queiram, de forma quase insultuosa, colher frutos, quando o partido que representam teve o poder de decidir e resolver este problema e nada fizeram, mas hoje aparecem pelos meios de comunicação, vangloriando-se de uma vitória que não lhes pertence. 

“A César o que é de César” e, neste caso, os esforços para resolverem o problema de Lustosa partiram da Câmara Municipal de Lousada, pela insistência junto da ARS e Ministério da Saúde. 


Eduarda Ferreira

Tu, ele, nós: A vida a desafiar os desafios

João Correia (PS)
A morte de Mário Soares é uma perda terrível para todos nós. Particularmente, direi ter sentido de forma quase onírica o desaparecimento de um dos fundadores do nosso sistema democrático hodierno e um camarada que sempre olhei com um temor reverencial positivo.
A história pessoal e vivencial desta personagem que marcou a vida política e social do nosso país durante mais de meia década, é por demais conhecida. Foram de Mário Soares os primeiros livros de teor político que li e foi um verdadeiro e singular privilégio ter podido confrontá-lo com as suas ideias. Momentos singulares e únicos; um homem de uma habilidade extrema de pensamento, fluído na sua expressão e honrado no seu combate. Como ele, sou um amante da social-democracia, sendo que a divisão sempre foi só uma: Deus.
A sua obra vai ser recordada e os historiadores serão, pelo menos, consensuais em considera-lo como um dos obreiros que evitou que o nosso país seguisse uma matriz soviética que, como é mais que óbvio, teria sido fatal para um país Atlântico e Europeu. A sua visão, respaldada por milhares de Portugueses, é o país que temos hoje, com virtudes e defeitos, mas (e agora sei-o) adorado por milhares de pessoas estrangeiras que olham para o nosso país com um misto de admiração e incompreensão pela nossa de portugalidade e amor próprio a um país que, afinal, não é assim tão mau.
Há uns anos, os Lousadenses também perderam um Mário muito parecido e dedicado, cheio de garra e com uma capacidade de luta invejável. Talvez Mário seja o nome das pessoas que são, afinal, capazes de desafiar os desafios.
Talvez seja possível que, cada um de nós, com vontade e empenho, se torne um “Mário” nas nossas comunidades, nas nossas atividades. Aí, provavelmente, aprenderíamos a amar a nossa terra, o nosso país, de uma forma igual e, quiçá, quase transcendente.
João Correia
in: YES Lousada

"O desempenho de Pedro Machado tem sido amplamente positivo e isso tem que ser reconhecido pelos Lousadenses"


Depois de 24 anos à frente dos destinos de Lousada, o TVS entrevista Jorge Magalhães, atual Presidente da Assembleia Municipal e a exercer funções como Vice-Presidente da Entidade Turismo Porto e Norte de Portugal.

Jorge Magalhães - Presidente da Assembleia Municipal de Lousada
TVS – Deixou a Presidência da Câmara Municipal de Lousada há cerca de 3 anos, depois de um período em que liderou os destinos dos Lousadenses durante mais de duas décadas. Agora com uma visão mais distanciada no tempo e apesar de ser difícil avaliar o seu próprio trabalho, como define o seu trabalho e de quem o acompanhou entre 1989 e 2013 no Município de Lousada?
JM – Creio poder dizer que o nosso desempenho foi muito positivo. É muito comum ouvir relatos de pessoas que vivem em concelhos vizinhos a Lousada e que conheciam o que era a nossa terra antes de assumirmos os destinos do mesmo, referindo que a diferença pela positiva é extremamente notória. Aliás, os variadíssimos indicadores publicados e conhecidos traduzem de uma forma inequívoca o que referi e, tanto eu como todos os meus amigos Vereadores que me acompanharam de 1989 a 2013 ficamos de consciência tranquila e muito agradados com tudo aquilo que conquistamos em prol dos Lousadenses.

TVS – Como tem decorrido a sua atividade profissional, agora que se encontra a trabalhar fora do nosso concelho, exercendo funções na Entidade Turismo Porto e Norte de Portugal. Como caracteriza o potencial turístico da nossa região e de Lousada?
JM – Tem decorrido de uma forma muito positiva num setor em clara expansão e afirmação. A região Norte tem demonstrado grande vitalidade pelo que se mostra aliciante e motivante este trabalho a quem está envolvido no setor, os desafios com que se deparam e as respostas que somos capazes de proporcionar.
Lousada tem também seguido uma política que nos parece adequada, sobretudo sem descurar a perspetiva regional. Assim, o Município apesar de ter caraterísticas particulares e de as enfatizar nas suas próprias iniciativas e dinâmicas, assume uma atitude proactiva e global face ao Turismo, tal como acontece, por exemplo, com a Rota do Românico.

TVS – Na última edição do TVS do ano de 2016, entrevistamos o Presidente da CM Lousada - Dr. Pedro Machado em que este elogiou e afirmou que o Dr. Jorge Magalhães é uma referência para ele enquanto autarca e sempre se irá rever naquilo fez por Lousada. Que balanço faz do atual mandato do seu sucessor?
JM – O desempenho de Pedro Machado tem sido amplamente positivo e isso tem que ser reconhecido pelos Lousadenses.
Nestes últimos anos, os autarcas devem ter sido aqueles que, na gestão pública nacional, sentiram mais dificuldades dados os constrangimentos que eram impostos advindos do poder central.
Entendo o desempenho do Município de Lousada como extremamente positivo. Esta opinião não é apenas minha mas também é plasmada nas várias publicações a nível nacional, onde Lousada tem consecutivamente apresentado indicadores de grande relevo e que não são possíveis de serem desmentidos.
Além disto, este é o sentimento que vejo ser-me reportado quando sou abordado por inúmeros cidadãos de Lousada, mostrando-se satisfeitos com o atual caminho traçado por este executivo municipal de Pedro Machado e, portanto, resta-me concluir que contra factos não há argumentos. Em Lousada, estamos a ser liderados com competência, profissionalismo e visão futura.


TVS – Exerce atualmente as funções de Presidente da Assembleia Municipal de Lousada, sucedendo ao Dr. Mário Fonseca e, Pedro Machado disse ao TVS que contava com toda a equipa que o acompanha atualmente. Está disposto a aceitar recandidatar-se, liderando a lista do PS para a Assembleia Municipal?
JM – Quando essa questão me for suscitada, dentro dos prazos estatutariamente previstos, irei obviamente responder. Neste contexto é ainda cedo e seria pretensiosismo de minha parte dizer algo mais sobre o assunto.

TVS – Estando praticamente definidos os candidatos à liderança da Câmara Municipal de Lousada, o que espera deste novo confronto eleitoral que se avizinha para Outubro?
JM – Sinceramente espero que o debate de ideias e projetos possa acontecer num tom de respeito e com elevação.

TVS – Dada a sua longa experiência política, acreditou na possibilidade de António Costa formar governo com o apoio parlamentar do PCP, BE e Verdes?
JM – No início, tal como muita gente, nunca estive muito convicto da assertividade e pertinência desta solução governativa e, na altura, provavelmente teria optado por outra solução.

TVS – Como avalia o trabalho de António Costa neste primeiro ano de mandato?
JM – Apesar de algumas situações que podem ser vistas como menos conseguidas, penso que a maioria dos Portugueses estará hoje bastante mais satisfeito com o desempenho do atual governo comparativamente com o anterior e julgo que se poderá dizer que os aspetos positivos desta solução são exponencialmente superiores aos negativos como temos notado com a diminuição do desemprego, défice e cumprimento de uma série de medidas prometidas por António Costa.

TVS – Durante os seus mandatos como autarca, teve que trabalhar com o governo liderado por António Guterres. Do que conhece do ex Primeiro-Ministro, o que espera do exercício das suas novas funções como Secretário-Geral da ONU?
JM – Comungo daquilo que já foi dito por inúmeras personalidades relevantes da sociedade Portuguesa sobre a eleição do Eng. António Guterres para Secretário-Geral da ONU. É o Homem certo para o lugar certo. É um Homem com um percurso pessoal e políticos que atestam bem a sua capacidade para ocupar o lugar, nomeadamente quando tem que colocar à prova a sua capacidade de diálogo, consensos, experiência Humanitária, verticalidade e solidariedade.

TVS – Há alguma mensagem que deseje enviar aos Lousadenses?
JM – Quero referir apenas que devem ter sempre a perceção que Lousada é um excelente Município para viverem.

Mário Soares (1924-2017) – Lutar pelo direito à indignação

Um dos maiores símbolos da história recente de Portugal faleceu no passado sábado. Eterno lutador pela liberdade, foi uma das muitas vozes que enfrentou a ditadura de António Oliveira Salazar e encaminhou o nosso país para o seio da Democracia, da integração Europeia (CEE) e internacional. Ele e muitos outros, fizeram parte de um grande momento da História de Portugal, onde pontificaram os Capitães de Abril – Revolução dos Cravos.

Muito se tem escrito sobre Mário Soares, mas melhor do que perceber uma escrita retrospetiva da sua vida, é necessário entender as suas (difíceis) decisões num determinado tempo, num determinado contexto nacional e internacional e isso, apenas aqueles que viveram esses duros momentos, terão uma visão mais desassombrada e esclarecida do que foi essa época.

Tenho reparado que muitas pessoas ao descreverem Mário Soares, ressalvam logo que este teve aspetos positivos e negativos ao longo da sua vida e não tomam parte, face à sua intervenção pública. Ora isso é precisamente aquilo que Mário Soares sempre foi – Um Homem, com virtudes e equívocos comuns a qualquer um de nós e não era certamente seu objetivo ser uma pessoa consensual, compreendida e aceite pela totalidade das pessoas – era um Político que teve de tomar decisões muito difíceis e, por isso, tantos o criticaram e tantos o admiraram. 

Quando se lê muita da repulsa que alguns tinham a Soares, nada disso o poderia preocupar. Como qualquer político que teve a responsabilidade de governar o país numa altura de ruptura face a um regime ditatorial de quatro décadas, existia certamente quem o odiasse. Mas acima de tudo, ele assumia-se como político, não tendo o medo que muitos dos que agora pululam em intervenções públicas/sociais tem, ressalvando sempre uma posição de independência face à política, quando na verdade aquilo que fazem e praticam é exatamente isso mesmo. 

Soares não rejeitava a política como outros sempre o fizeram. Soares assumia-se, quer gostassem, quer não.

É por isso que ao longo da última semana, as redes sociais eram um receptáculo de fervorosos adeptos anti e pró Soares, aos quais se deve dar o devido distanciamento a todas estas opiniões, muitas das vezes conspurcadas com teorias da conspiração sem qualquer validade ou verdade, mas que sobrevivem no obscurantismo e, como tudo, uma mentira dita muitas vezes, passa a ser verdade.

A este propósito, o jornal Público elaborou uma peça em que analisa ao pormenor alguns dos boatos que se propagam sobre Soares. 

A velha teoria do “exílio dourado” em França, como se fosse agradável estar longe da mulher e dos filhos, impedido de voltar a casa, sob pena de ter preso, torturado, deportado pela PIDE ou até assassinado - é apenas uma das histórias inventadas na altura pelo Estado Novo, de forma a tentar demover e criar dúvidas a todos aqueles que apoiavam Soares e Cunhal.

A alegada profanação da bandeira nacional também nunca aconteceu. O Público afirma que “o incidente teria ocorrido durante uma manifestação em Londres, em Julho de 1973, organizada para contestar a visita de Marcello Caetano ao Reino Unido. Na manifestação, cujos registos são públicos, participaram socialistas e comunistas portugueses e uma miríade de movimentos britânicos de oposição à colonização lusa em África e também ao apartheid. Mas não há registos da suposta profanação do símbolo nacional e muito menos do envolvimento de Soares no ato. O próprio o nega em entrevista a Maria João Avillez (tornada em livro em Mário Soares: Ditadura e Revolução): “Um patriota e um republicano, como eu sou e sempre fui, nunca iria pisar a bandeira da República, que nunca foi a bandeira do salazarismo”. A história, dizia, era uma “imbecilidade”(in: Público).

Por fim, aquela teoria que mais adeptos tem, uma vez que foi capa do jornal A Rua (1977) – jornal de ideologia fascista, citando alegadamente um jornalista brasileiro a quem Soares disse que os Portugueses em África deveriam ser “atirados aos tubarões”. Segundo o Público, não existe qualquer artigo do jornalista Santana Mora, correspondente do jornal brasileiro “O Estado de São Paulo”, que expresse essa frase, sendo uma clara manipulação jornalística durante o período conturbado da descolonização.

A descolonização foi talvez o processo que mais inimigos lhe trouxe, mesmo não sendo ele o principal rosto desta ação – à data, era Ministro dos Negócios Estrangeiros (I, II e III Governos Provisórios), mas também nunca recusou responsabilidades.

Hoje, alguns dirão que a descolonização foi mal feita. É trágico, certamente, Portugueses que viviam em África, ficarem sem o seu património e terem que regressar (ou viajar pela primeira vez) para um local que nada lhes dizia. Contudo, há que entender o contexto de uma medida que era impensável não ter sido tomada.

Após a revolução, dia após dia, havia relatos de deserções de militantes Portugueses em África. Soldados que não estavam na disposição de morrer numa Guerra que nada lhes dizia e que a maioria discordava. Em África, “o PAIGC tinha proclamado unilateralmente a independência em 1974, era reconhecida por mais de 80 países”, a ONU aprovava constantes resoluções contra a manutenção Portuguesa das Colónias, os principais líderes partidários Portugueses eram favoráveis à saída de África (Freitas do Amaral, Cunhal, Sá Carneiro) e o protelar deste combate, com adversários a ganharem cada vez mais força e combatendo contra tropas desanimadas, teria um fim ainda mais trágico e sangrento (in: ISCTE).

Em Portugal faziam-se manifestações sob o lema "Nem mais um soldado para as colónias!" e a comunidade internacional, desde o período do Estado Novo, exigia a Portugal que entregasse as suas colónias, tal como haviam feito os Franceses (na Argélia), Britânicos (na Índia) e Belgas (no Congo). Portugal era assim o último país colonialista Europeu e tinha a pressão constante de aceitar a independência desses países. Se Portugal queria reconhecimento internacional, tinha que fazer a descolonização de forma rápida e com o mínimo impacto possível, mas obviamente que muita coisa correu mal. Afinal, estamos a falar de quase de um milhão de Portugueses que regressavam a Portugal sem nada na bagagem…

Mário Soares soube sempre lidar com os seus críticos, os que o acusavam de enriquecer na política, mesmo toda a gente sabendo que o pai de Soares era dono de um dos colégios Portugueses mais ricos da altura – Colégio Moderno e proveniente de famílias abastadas. Por isso defendeu os presos políticos sem cobrar honorários. Defendeu a família de Humberto Delgado, foi advogado de Álvaro Cunhal sem temer qualquer represália que sabia vir a existir.

Mário Soares detido em 1967

Enquanto jovem, poderia muito bem entregar-se aos “prazeres da vida”, ajudando o pai a gerir o lucrativo Colégio Moderno e alinhando, porventura, ao lado do status quo instituído, mas Soares resolveu combater Salazar elevando as suas convicções por um país livre e igual. Esteve ao lado de Norton de Matos e Humberto Delgado, foi preso 13 vezes, torturado pela PIDE, deportado para São Tomé em 1968 sem acusação numa altura em que era imperativo desviar atenções, dado que acabara de rebentar o escândalo Ballet Rose que envolvia ministros de Salazar – esta deportação valeu a Soares uma homenagem por parte da Amnistia Internacional face à sua condição de preso político – sendo posteriormente enviado para o exílio em 1970. Acresce a tudo isto o facto de até ter casado por procuração, de forma a permitir as visitas de Maria Barroso à cadeia.

Há portanto a necessidade de centralizar as suas tomadas de decisão com os acontecimentos da própria História e compreender os momentos. Como Daniel Oliveira (Expresso) afirma, Soares abraçou Cunhal na chegada deste a Portugal e combateu-o a partir da Fonte Luminosa, foi amigo e camarada de Salgado Zenha e lutou contra ele, defendia o Estado Laico mas enaltecia o papel da Igreja Católica, apoiou nacionalizações e a iniciativa privada, esteve do lado e contra Manuel Alegre, defendeu a austeridade em 83 e combateu-a em 2011, colocou Portugal na CEE e criticou o rumo que a União Europeia estava a tomar. Estas tomadas de posição trouxeram inimigos, mas acima de qualquer questão, defendeu a democracia e a liberdade.

Não tenho a intenção de defender Soares, até porque este convivia muito bem com a crítica. Mas acima de tudo não podemos aceitar que alguns queiram reescrever a sua História, depois de morto, diabolizando alguém que lutou, ao lado de muitos outros, pela liberdade de um povo e foi eleito diversas vezes pelo voto popular para representar a nossa Nação nos mais diversos cargos.

Mário Soares não é o pai da democracia Portuguesa, porque esta não tem pai. A democracia foi conquistada através da ação última dos militares, mas acima de tudo pela ação de milhares de anónimos que se insurgiam diariamente contra um poder cego e instituído brutalmente e promotor da miséria, analfabetismo e fome. Soares foi mais um que lutou e teve oportunidade de ter um papel relevante na construção do nosso país. Mas Mário Soares será certamente recordado na História de um país onde todos podem pensar o que quiserem do seu papel na nossa sociedade. Felizmente, o delito de opinião já não existe!

“Lutei pelo direito à indignação. 
Muito antes de permitirem a existência de indignados”
Mário Soares

Nelson Oliveira (in: jornal TVS - 12.01.2017)